O que eu aprendi com a história de Rute

Karina Mendonça
6 min readJun 14, 2020

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Muitos leem o livro de Rute e o veem apenas como uma bela história de amor. Houve um tempo em que a percebi desde forma, até que autores como Emilio Garofalo Neto¹ e John MacArthur² me ensinaram a olhá-lo com outros olhos. Gostaria de compartilhar então, os ensinamentos que obtive com as leituras dos últimos anos, sobre a história de Rute.

A história começa com a saída de Elimeleque e família (sua esposa Noemi e seus filhos), deixando Belém, devido a grande escassez, e indo para Moabe. Assim, aprendi que não devo agir por impulso e ambição, como Elimeleque, mesmo que pareça ser o melhor para minha família, momentaneamente, pois, vale lembrar que eles estavam deixando a terra prometida, e nada é melhor para as nossas vidas do que as promessas do Senhor.

Afastarmos-nos dos caminhos do Pai, é fácil, muitas vezes. Basta uma decisão. E neste momento, raramente procuramos ajuda com aqueles que nos levarão ao caminho correto. E o pecado toma conta das nossas vidas. Então, torna-se cada vez mais fácil vivermos afastados e cada vez mais difícil voltarmos para os braços do Senhor. É assim desde que o pecado entrou no mundo, pois “Deus permite que vivamos e soframos a consequência dos nossos pecados e caminhos maus”¹.

Ao continuar a história, Elimeleque morre, e, poucos anos depois, seus filhos também. Porque o pecado, nunca fica impune. É quando Noemi decide voltar para a terra prometida. Neste momento, Orfa, uma de suas noras, decide ficar, enquanto Rute, decide largar sua terra, seus costumes, seus familiares, seus ídolos e seguir com Noemi.

Apesar de arrependida, Noemi sentia-se amargurada e envergonhada por voltar para casa após longos anos, e ainda, com uma moabita. Com isso, lembrei-me de quando voltei para o Pai, após longos anos em pecado. Senti vergonha e procurei não voltar para onde me conheciam, pois sei como as pessoas são tratadas quando voltam para a igreja após longos anos fora dela. Demorei a entender que “Deus sempre nos recebe de volta, como um pai que sempre abre os braços para acolher os filhos”¹.

Apesar da amargura, a Escritura mostra, que Noemi permaneceu firme na fé durante todos os anos, e talvez por isso Rute tenha decidido segui-lá. Entretanto, a amargura a impediu de ver tudo o que Deus estava fazendo em sua vida. Quantas vezes não deixei que a amargura e a dor me impedissem de apreciar as bênçãos e as maravilhas de Deus em minha vida? Quantas vezes não deixei de agradecer por momentos e pessoas, por puro egoísmo emocional?

Em, A Loving Life, Paul E. Miller, descreveu sobre Rute da seguinte forma:

Mas essa solidão, esse morrer, ao invés de ser o fim, pode demonstrar a beleza de Jesus em você. O momento em que você pensa que tudo saiu errado é exatamente o momento em que a beleza de Deus está brilhando através de você. Glória verdadeira é quase sempre escondida — quando você está aguentando calado sem uma multidão incentivando. Quando velhos soldados se reúnem para refletir sobre suas experiências de tempo de guerra, eles não pensam sobre cerimônias de entrega de medalhas em que o mundo honra seu valor. Eles pensam na batalha, no sacrifício, no que passaram — essa é sua glória. Quando você continuamente faz uma tarefa da casa sem ouvir agradecimentos, e até mesmo com críticas, essa é sua glória. Amor escondido despedaça o ego. Entrar em Belém sozinha, uma estrangeira, sem um homem protetor — somente Yahweh — essa é a glória de Rute.

A história continua com Rute indo trabalhar no campo de Boaz. Uma feliz coincidência? Claro que não! “Devemos nos lembrar dessas lições. Coisas casuais à nossa vista na verdade são planejadas pelo Todo-poderoso. Não há acaso. Este simples fato deve nos confortar o coração.”¹ Boaz era descendente direto de Raabe (bisneto), deveria conhecer sua história e talvez isto o deve tê-lo tornado mais sucessível a compadecer-se com a história de Rute.

Rute poderia ter ficado em casa a espera de ajuda, mas decidiu sair para providenciar, através do seu trabalho, o sustento para ela e Noemi. Com isso, aprendi que, não adianta orar sem agir. E é preciso a confiança de que Deus sempre está à nossa frente, providenciando o futuro e cuidando dos detalhes através de cada pequeno acontecimento (os chamados “acasos”) da nossa vida.

Boaz é o que chamamos de “resgatador”, na história, é aquele capaz de devolver a Noemi as terras que Elimeleque deixou ao ir embora. Também é conhecido como um reflexo de Cristo no Antigo Testamento. Ele não era jovem e mesmo assim Rute se interessou por ele. Da mesma forma, Rute tinha um passado pecaminoso, era moabita, e mesmo assim, ele se interessou por ela. Isso me faz pensar sobre os jovens cristãos atuais e suas buscas por relacionamentos perfeitos.

Os jovens que procuram meninas “virgens”, sem passado e que, de preferência, tenham crescido na igreja. Meninas que procuram jovens reformados, barbudos, teólogos e com vasta bibliografia. E onde entra o perdão? E a redenção de Cristo? Serve para todos os outros, mas não para aqueles a quem queremos nos relacionar? Cristo morreu e perdoou todos, mas não aquele/a jovem que possui um passado longe de Cristo? É isso? “Vale sempre lembrar aos que não andaram por caminhos escuros: foi apenas a misericórdia de Deus que impediu que isso ocorresse”¹.

Mais adiante na história, para conseguir casar-se com Rute, Boaz precisa da permissão de um parente, aquele que é, na verdade, o primeiro na hierarquia, entretanto, este recusa, pois sabe que, ao casar-se com a moça, estará renunciando ao seu nome em favor do nome e descendência de Rute e Noemi. Assim, ao casar-se com Rute, Boaz renuncia seu nome e suas terras, por amor à Rute, mostrando que não importa o quão complicadas possam ser as circunstâncias, se o amor é obra de Cristo, vale a pena.

Porque muito mais importante do que nosso nome, nossos bens, é o amor de Cristo. Por isso devemos fazer tudo para Cristo e por amor a Ele. Arrependendo-nos diariamente, lembrando-nos da nossa pequenez e lembrando-nos do sacrifício do nosso verdadeiro resgatador, Cristo, nosso Senhor. Que, na cruz, enquanto nos resgatava, gritou ao pai, “Eloí, Eloí, lamá sabactâni? — “Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste?- (Mt 27:46), tamanha a dor que sentia causada por todo o nosso pecado.

Ao final da história, Noemi já não estava mais amargurada, ao contrário, seguia feliz, com sua descendência ao seu redor. Com Rute, que valia mais do que sete filhos e de volta a terra prometida. Ao terminar a história, é impossível não pensar nas formas como Deus age, cuidando de cada pequeno detalhe. Obede, filho de Rute e Boaz, viria a ser avó de Davi, descendente de Jesus.

E é estranho pensar que, para que toda a história se desenvolvesse, foi necessário que Elimeleque morresse, assim como Malon, marido de Rute. Ou seja, a vida dessas mulheres foi envolta em dor e desgraça antes de todas as bênçãos. Isso também acontece conosco. Para que coisas boas aconteçam, é preciso que tantas outras coisas “terminem”. É preciso que portas se fechem, que pessoas vão emboras, para que outras passam chegar.

E o maior ensinamento de todos, é que não importa por onde você tem andado, Cristo sempre estará a sua espera. Você sempre poderá voltar aos braços do Pai. Não importa se você foi embora como Noemi, ou se você nunca o conheceu como Rute, ou se você sempre esteve em casa, como Boaz. Cristo é nosso Pai e sempre vai nos amar e nos acolher como seus filhos, basta que nós o procuremos e o busquemos.

Caso você deseje amar a Deus, então ele já começou a mudá-lo. Ele já começou a abrir seus punhos fechados, retirar sua sujeira para ser lavada na cruz. Deus cospe na areia e faz lama para limpar seus olhos. Sua alma aleijada pegará seu leito e andará. Ele o conduzirá pelo caminho e pela barriga da baleia. Do outro lado, você surgirá refeito, correto. ³

¹ Emilio Garofalo Neto, As Boas Novas em Rute, Redenção nos Campos do Senhor (Brasília: Monergismo, 2018)

² John MacArthur, Doze Mulheres Notáveis (São Paulo: Cultura Cristão, 2014)

³N. D. Wilson, Notas da xícara maluca (Brasilia:Monergismo, 2017)

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Karina Mendonça

Alguém que acredita que a escrita pode fazer coisas maravilhosas, desde mudar o mundo até fazer alguém sorrir.